Uma questão presente entre alguns metodólogo(a)s e
anarquistas é da possibilidade de existir um método próprio que se
possa denominar anarquista. Seria fácil fugir da tarefa se afirmamos
que o simples ocorrência de existir um método que se está a
estabelecer uma hierarquia, por tanto, já não mereceria essa
denominação.
É necessário dissipar essa dúvida ao se reafirmar
que a hierarquia a que se contrapõem anarquistas é de uma pessoa ou
grupo de pessoas oprimindo outras. É no âmbito político e das
relações humanas (homem/mulher, educador/educando, sabedor/fazedor,
rico/pobre, experiente/inexperiente, forte/fraco ou qualquer outro
par dialético com as características de sobrepujamento).
O método anarquista não existe da forma com se
imagina ser a aplicação aleatória, inexata, a-objetificante,
descompromissada ou ideologicamente definida pelo acratismo
(anarquia).
Anarquistas do final do século XIX até a década de
1960 não se preocuparam em criar um método próprio para o fazer
científico. Tal não era a preocupação com isso que todos os
trabalhos de profissionais anarquistas são marcados pelo método
indutivo.
Afirma melhor sobre isso Fernand Pelletier em obra
recente, de 2009, não traduzida para a língua portuguesa ao retomar
uma polêmica afirmação de Kropotkin com os seguintes dizeres:
Todas [descobertas do século XIX] foram feitas pelo
método indutivo – o único método científico. Pois sendo o homem
é uma parte da natureza [...] não há, por isso, nenhuma razão
para que [...] abandonemos o método que até o momento teve boa
serventia, para fazer com que se busque outro dentro do arsenal
metafísico. (KROPOTKIN, 1913 apud PELLETIER 2009, p. 157) (tradução
do autor).
Esta afirmação extraída por Pelletier demarca algo
que já é notoriamente conhecida na geografia que se debruça sobre
o pensamento de Elisée Reclus e Piotr Kroptkin. Não querendo
simplificar, ambos os dois geógrafos anarquistas seguiam a escola da
geografia moderna, apostando na razão e no cientificismo por
acreditarem que a ciência seria capaz de esclarecer a humanidade os
erros de suas crenças, costumes, preconceitos e ignorância.
Em razão de tão evidente comportamento filiado à
ciência não temos bases para debater um método especificamente
anarquista nos trabalhos desses dois geógrafos anarquistas.
Pelletier, contudo, consegue avançar no tipo de resultado
e pensamento anarquista na forma de
compreender os resultados dos trabalhos realizados por eles, trazendo
para nós avaliações importantes.
A posição de Pelletier se inicia com uma crítica a
Paul Feyerabend que é citado em alguns textos como autor importante
para a formação de um método anarquista. Pelletier (2009, p.157)
avalia que Feyerabend não se apoiou no movimento anarquista para
construir seus enunciados e nem considerou as experiências ocorridas
na Revolução Russa (1917-1922) ou da Guerra Civil Espanhola
(1936-1939), por isso, esquecendo “[...] as práticas sociais
concretas e massivas que dragou intelectuais. Permitindo escamotear
os pensamentos próprios que foram a base dessas práticas”.
(PELLETIER, 2009, p. 157).
A crítica feita por Pelletier a Feyerabend se estende
dizendo que ele apenas compreendeu erroneamente o anarquismo ao
assimilar a ausência de lei ou ordem propugnada por anarquistas com
o posicionamento de não considerar o sentido mesmo ou razão da
existência da lei e da ordem. Se nos afastamos da crítica para
entender que Feyerabend lançou uma provocação pertinente, ainda
assim, isso não nos oferece uma solução para que tipo de
pensamento se coloca diferente em intelectuais anarquistas em suas
assertivas científicas diante das outras correntes comprometidas com
a ciência.
A máxima citada de Feyerabend “Qualquer coisa
serve” pode ser entendida no sentido literal ou concreto da opção
metodológica e a irracionalidade contida nela pode gerar um saber
científico, mas tais resultados podem estar menos engajados nas
razões e seriedade anarquista, portanto, não serem anarquistas como
propositura final. Reflexão de partida anarquista, pode assim, não
gerar uma construção teórica engajada com a ação anarquista.
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