Escola Nossa
Senhora do Carmo Bananeiras PB:
O olhar
da educadora Amanda Nágilla Silva Albuquerque
Escola
democrática na Paraíba segue exemplo das melhores escolas e projetos
educacionais do mundo.
Em 2016-17 fui professor
temporário da UEPB em Guarabira PB e tive contato com muitos estudantes com
suas preocupações sobre os Trabalhos de Conclusão de Curso -TCC. Essas pessoas
jovens estudiosas ficam muito aflitas na busca de um tema e há sempre um desejo
de mudar o eixo de rotação terrestre com esses trabalhos de final de curso. Um
dos motivos que me levou fazer um doutorado em formação de professores foi
notar em 2003, quando outrora fui professor da UEPB e constatei que nem um TCC da
instituição em mais de 20 anos de curso, até àquele momento se dedicava à
docência. Os TCCs de um curso de formação de professores sempre eram em áreas
técnicas próprias do bacharelado ou monografia entediantes que falavam de tudo
e de nada. Esse comportamento é estudado, não é exclusivo ao Brasil e embora a
maioria dos cursos de Geografia do mundo tenham começado com licenciaturas,
comum é que corram para especialidades diferentes da Educação Geográfica.
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Assembleia |
Sempre me impressionou desde
minha graduação na UFPB, onde havia a famosa segunda opção em que muitos
escolhiam Ciências Jurídicas e terminavam condenados ao Curso de Geografia por
não fazer a pontuação necessária para a primeira opção. Então, como desculpa
para não se envolver nas exigências das disciplinas essa desculpa ia até essas
pessoas concluirem o curso de licenciatura e alguns ainda faziam bacharelado,
mantendo a desculpa, conseguiam sucesso em concurso para professores e ainda
mantinham a cabeça em sua especialidade, embora limitada para a docência.
Embora o ENEM tenha corrigido isso em parte, na UEPB, como em muitos cursos de
licenciatura continua existir esse namoro com a área técnica, sem ter formação
técnica ou precária na mesma proporção que se rejeita a docência que é o
destino final de todos que formam em Licenciatura e Bacharelado. Ser apaixonado
por área é bom, mas desprezar a docência é bizarro.
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Tutoria em grupo |
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Alimentação natural, direta e de qualidade |
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Pesquisa e projetos autonomos |
Nesses
diálogos com uma graduanda, Amanda Nágilla Silva Albuquerque, surgiu o assunto
sobre uma escola do campo na cidade de Bananeiras e que eu lhe disse ser um
tema importante para a geografia e que poderia ser um TCC. Estudantes de curso
noturno e ou trabalhadores, que residem em outras cidades, mães e pais enfrentam
um imenso desafio de se sustentarem, cuidarem da vida e favorecerem uma
formação intelectual e acadêmica robusta. Escolher um tema é mais difícil que
arranjar um casamento que preste.
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Lema permanente da comunidade educativa |
Amanda
pontuou algumas características dessa escola, mas não teve tempo de aprofundar,
mas ficou a semente. Lembro-me apenas que indiquei, antes de qualquer coisa que
lesse Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire e se interessasse por mais que
desse uma olhada no meu trabalho de doutorado. Inspirado por esses futuros
professores eu os levei na Escola Olho Vivo do Tempo – Evot em João Pessoa.
Logo eu decidi não permanecer na UEPB em decorrência de uma greve que o reitor
rescindiu nossos contatos a despeito de dizer que não ia fazer isso e eu não me
sentindo bem com esse tratamento preferi voltar para o campo da Cultura.
Esta
escola é resumida no trabalho de Amanda nesta passagem a seguir:
Escola Nossa Senhora do Carmo
possui 283 alunos, destes, 7 possuem o laudo de portadores de necessidades
especiais. O corpo docente conta com 18 tutores (9 no turno da manhã e 9 no
turno da tarde), um/uma especialista
para cada disciplina e alguns tutores são também os especialistas. A escolha
destes é feita por meio de entrevistas. Coelho (2015, p. 63) enfatiza que “para tanto, privilegia-se
aqueles que moram no seu entorno. Busca-se valorizar, ainda, o professor que
tenha experiência e/ou afinidade com projetos sociais.” O currículo do docente
também é avaliado, com intuito de perceber se os mesmos possuem qualificações
para atuar enquanto docentes. A escola possui uma organização centrada em uma
gestão democrática. E, para isto, conta com comitês, colegiados, conselhos e
assembleias, almejando integrar pais, alunos, e todos os funcionários da escola
nas decisões a serem tomadas. Fazem parte do conselho escolar, o corpo
diretivo, estudantes, professores, funcionários e pais. É neste conselho onde
se reflete as práticas vividas na escola, dando espaço de fala aos diversos
sujeitos que a faz, sendo assim, o processo educacional pode ser visto,
comentado e refletido a partir dos diversos ângulos da escola. O conselho de
classe é formado pelos professores e corpo diretivo, a fim de avaliar o
processo de ensino-aprendizagem da escola:
Esta descrição é
semelhante as das escolas pertencentes ao Movimento Internacional de Escolas
Democráticas (Democratic Schools Mouvement)*. Os princípios possuem suas bases
na Escola Summerhill criada em 1930 por A.S Neill também apelidada de escola
sem portas os escola da felicidade, cuja frase conhecida define em parte seu
espírito: “E melhor formar garis felizes do que ministros neuróticos”.
Amanda em sua humildade
estava descobrindo um exemplo de ponta na educação mundial que são as
pedagogias construtivistas, de/por projeto e por grupos de afinidades, só que,
estava ali bem próxima de sua casa, de sua vida e atuando com recursos em parte
próprios, dos apoiadores, responsáveis e alguns aportes da prefeitura de
Bananeiras e do Governo de Estado da Paraíba. As características do surgimento
da proposta estão centradas em Paulo Freire, Escola da Ponte e da formação das
freiras fundadoras que conduziram a uma educação realista e engajada na
realidade local, seguindo o método antiautoritário, de autoaprendizagem e da
autonomia do sujeito diante de si e da sociedade que os cercam.
Embora Amanda registre
que a comunidade escolar siga os padrões legais da LDB e de outras diretrizes
nacionais, fato é que a escola está muito além dessas leis no que concerne os
seus resultados e práticas. Sendo não somente bem-sucedida, como premiada com
certificações formais.
Nos últimos 4 anos os
brasileiros educadores e do mesmo modo paraibanos são bombardeados com matérias
nacionais e locais sobre os benefícios da educação feita na Finlândia,
inclusive, argumentava-se em loas o modelo finlandês para apoiar o decreto da
mudança do ensino médio imposta pelo governo Temer.
Há até momentos que vemos
autoridades locais recendo reforçando o modelo finlandês de educação. A Escola
Nossa Senhora do Carmo em Bananeiras tem realizado este trabalho com maestria,
embora com restrições econômicas e sociais no local onde se instalou. Este não
é o único exemplo, já citei a Escola Viva Olho do Tempo* no litoral sul da
Paraíba e podemos indicar o Centro
de Educação Popular (CENEP)*** em Nova Palmeira no Curimatau paraibano como
promotora de uma educação democrática. Isto não quer dizer que não haja outras
ações educacionais antiautoritárias na Paraíba ou que sejam organicamente
engajadas com populações que abrigam essas escolas. Há ainda escolas do campo
dos assentamentos organizadas pela CPT, do MST e outras com menos destaque que
estão num esforço de garantir uma educação pautada na autonomia das crianças e
jovens e com olhar para a comunidade.
Vale aqui ainda fazer menção póstuma a Lucia Geovana, professora do
departamento de arquitetura CT/UFPB que esteve na gestão da Escola Catavento e
SesquiCentenário em João Pessoae posteriormente em Areia-PB como referência de
educadora a ser refletida em qualquer reforma educacional do Estado da Paraíba,
antes de gastar rios de dinheiro fora do país para ver o que já existe por aqui
com bastante sucesso.
Os dados colhidos por Amanda são um alerta e um alento importante, já
que as pontuações no exame nacional de ensino básico colocam essa escola acima
da média municipais, estaduais e nacionais e próxima das melhores pontuações
nacionais. Ver tabela:
Fonte: Amanda Nagilla, 2019.
Com esses dados positivos
a Escola Nossa Senhora do Carmo recebeu do MEC em 2016 o Certificado de escola
em referência e inovação e criatividade na educação básica.
Importante notar que os
preceitos e práticas dessa escola e de outras com métodos e princípios
pedagógicos e comportamentais com ênfase a autonomia do sujeito, na democracia,
em turmas por projetos, afinidades e organicamente envolvida com a comunidade é
que todas as regras educacionais nacionais são cumpridas, mas formatar essas
práticas nos esquemas formais de aulas, notas e outras demandas documentais
reduzem a experiência ao enquadramento. A escola é inovadora, mas as regras
formais e legais que as regem são arcaicas.
Solicitei a Amanda que
após a concussão desse trabalho como ela enxerga essa experiencia em sua vida?
Segue sua resposta:
Quando eu pus os meus pés na escola
nossa senhora do Carmo, eu senti uma alegria, um amor... Eu senti o verdadeiro
sentido da educação. Me lembro que no meu primeiro dia de observação eu tava
tão feliz naquele espaço que mandei uma msg para meu orientador, dizendo: estou
feliz aqui❤.
Eu me senti realizada naquela escola, enquanto professora e ser humano.
Eu passei cerca de 2 meses
vivenciando o dia a dia da escola. É um ambiente maravilhoso. Eu poderia
definir este espaço em três palavras: amor, alegria, respeito.
Ao final da observação, eu saí da
escola nossa senhora do Carmo com a certeza de que é possível existir uma
escola diferente das que estamos acostumadas.
Inevitavelmente fiz comparações
entre ela e as escolas que já trabalhei. É uma diferença enorme!!
Principalmente na questão do respeito entre todos que estão inseridos na
escola.
No início dessa minha pesquisa eu
cheguei a pensar em desistir, achei que isso não seria possível, que era apenas
uma utopia, que a escola poderia não funcionar como eu imaginava... Eu
realmente estava enganada. Ela é muito mais do que eu esperava! É de uma
organização incrível, e resultados surpreendentes! Eu vi que que é possível
transformar nossas escolas! Não é fácil... Mas não é impossível!
Na minha vida enquanto pessoa e
profissional, a escola me mostrou que a educação só funciona verdadeiramente
com amor. Com entrega. Lá eu compreendi perfeitamente o sentido das palavras de
Paulo Freire, quando disse que não podemos falar de educação sem amor.
A escola mudou meu olhar sobre a
educação, sobre os alunos. Me trouxe novos horizontes enquanto docente. Me fez
refletir sobre o que eu vinha pondo em prática esses anos enquanto professora.
Hoje, eu busco passar para os meus alunos e a equipe de profissionais com a
qual eu trabalho, mais amor, compreensão e respeito. Pois eu vi com meus
próprios olhos que a escola pode ser um ambiente muito mais agradável se
olharmos melhor para o outro.
Outras
escolas do Brasil que podem ser consultadas
- Associacao Cidade Escika
Aprendiz, Sao Paulo
- Centro Integrado de Educacao de
Jovens e Adultos do Campo Limpo (CIEJA) Integrated Center for Young and
Adult Education of Campo Limpo, Sao Paulo
- Escolas Lumiar, Sao
Paulo
- Live College, Sao Paulo
- Politeia, Sao Paulo
- Teia Multicultural School, Sao Paulo
- Tuyuka School - https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Tuyuka