Fui avaliador de livros didáticos
de Geografia
Todos estamos passando por um
momento absurdo com atrofias no sistema educacional vindas com esse troço chamado
bolsonaro e o atraso que o segue. Irei recuar um pouco em 2005 e 2006 quando eu
estava no início do doutorado e fui convidado por Carminha e Eliseu Spósito
para ser avaliador do Plano Nacional dos Livros Didáticos, conhecido PNLD e
falado como PeNeLeDê.
O PeNeLeDê foi uma conquista do
Governo Lula e Dilma, mas que já era gestado no governo FHC em decorrência de haver
uma industria bélica de produção de livros e distribuição que domina o mercado
editorial do Brasil e equiparável a poucos países.
Eu achava estranho se pagar para
alguém fazer análise prévia de livros, já que para mim a autonomia do sujeito e
intelectual como professor não permitiria alguém fazer uma prévia apreciação
para mim. Confesso aqui que quando fiz minhas primeiras aulas, não fosse um
amigo experiente eu quase comprava um almanaque Abril para dar aulas de coisas.
A dificuldade de um professor recém
formado ou já na ativa escolher um livro didático é difícil e muitos acabavam
seduzidos pelas editoras. Aprendi nesse processo que o PeNeLeDê era razoável e nem
era um ranqueamento ou pré-digestão intelectual.
Eu avaliei uma coleção muito
popular no Brasil de 5ª a 8ª série. Foi fornecido formulários, orientações e que
outro especialista estaria fazendo o mesmo trabalho. Não me lembro de
todos os critérios, mas era assim:
Excluir imagens e textos com erro
de português, identificar termos, textos e imagens com preconceitos contra
mulheres, negros, índios, minorias e classe trabalhadora. Também preocupar com estereótipos
regionais, geografia estritamente descritiva, aspectos ambientais, se mais
rural ou urbano, criatividade e pertinência das atividades propostas e suas ênfases
e a apresentação visual, se inovadora e se poluída, quer dizer, bem dividido entre
imagens textos, cartogramas e mapas e respeito às convenções e conceitos
geográficos. Havia muitos critérios e ao anotar qualquer rejeição se exigia
justificativa com corroboração bibliográfica consistente para realizar um
parecer final. Este parecer final seria confrontado com outro avaliador e um
mediador regularia se houvesse discrepância em questões comuns um dizendo
péssimo e outro excelente. Óbvio que os avaliadores eram de especialidades
diferentes no que se chama física e humana.
Tudo devia ser sigiloso, afinal
ocorreram experiências passadas de assédio das editoras a alguns pareceristas que
lhes faziam um inferno para que a análise não condenasse ou que a pontuação
favorecesse as suas coleções, embora nunca ocorresse rank.
Vc já imaginou quanto custa um edição de uma grande editora e o contrato de compra para todo o Brasil!?
Vc já imaginou quanto custa um edição de uma grande editora e o contrato de compra para todo o Brasil!?
Não podia haver ranqueamento. Uma
obra pode ter muitas atividades e não tratar profundamente de meio ambiente.
Assim, o professor que lesse o catálogo escolheria os livros que se adequassem
às necessidades e habilidades suas e de suas classes. Infelizmente, muitos
diretores e professores escolhiam o primeiro livro da lista achando que era
ranqueamento ou fatigados pela vida docente.
Este mercado envolve milhões de
reais de compras com dinheiro público e é justificável que o governo saiba o
que vai se comprar e avaliar a qualidade, a legalidade, o respeito à língua formal
e à ciência em geral com ênfase na Geografia.
Todos os livros que se pretendem
ser comprados para o ensino público precisavam de um aferimento, pois erros conceituais,
preconceitos e erros de protugues eram comuns antes do PeNeLeDê. O anedotário
das primeiras avaliações era de envergonhas Damares.
A polêmica atual sobre o decreto
que afrouxava essas inquietações, que permitia até publicidade e erros tem um
custo gigantesco. O controle de qualidade tão alardeado pela reengenharia, ISOs
e tantas medidas de qualificação de produto muito postas pelos governos Neo
Liberais e das gestões empresariais devia ser aplicados na coisa pública.
Nem uma empresa privada de educação
compraria milhões em livros sem saber o que
adquiria e com qual finalidade, então, por que a coisa pública teria que
ser frouxa!?
Logo mudaram de ideia, pois como
a imprensa divulgou era menos uma incompetência e mais um negócio entre as
editoras e esses homens da linha Temer|bolsonaro. Agora tentarão roubar de outro
modo. Aguardemos!
Eu entendo a necessidade do livro
didático. Sou como muitos educadores que sempre temos que fazer material
adicional. Atualizar é esforço diário e a coleção só recebe atualização de 5 em
5 anos, quando toda a avaliação precisa ser feita. O Livro didático não é tudo,
mas também não é perda de tempo e sim um instrumento que pode acabar virando o
único, segundo as condições de trabalho dos professores.
Um fulano fanático nem adentrou
nessas questões. Acredita que a educação é partidária e ideologicamente
penetrada e blindadamente bem sucedida. Sabemos que a Geografia crítica é
marxista, mas também sabemos que é científico e metodológico. O marxismo não
nega a ciência. O método é sempre se colocar em dúvida, contradição e confronto
de ideias. Os educadores marxistas sabem que seu esforço é a educação crítica e
não a adoção ao marxismo que só se faz pela práxis.
Estamos vivenciando a era das
patranhas maldosas, asquerosas e propositadas para o mercado. As questões de costumes
são todas inerentes a mercados, primeiro o do voto conservador que embarca como
criança com chupeta e segundo a um ultraliberalismo fascista servil e entreguista.
O Brasil está à venda!