Dialética de Elisée Reclus e divagações!
Aviso: Este texto é exploratório, por isso, pretensioso e desarmado! Por tanto, não leve-o tão seriamente, afinal, é mais para encher o saco do que um contribuição exaustiva!
Aviso: Este texto é exploratório, por isso, pretensioso e desarmado! Por tanto, não leve-o tão seriamente, afinal, é mais para encher o saco do que um contribuição exaustiva!
Das
divergências teóricas, políticas e metodológicas entre marxistas
e anarquista pode ser citada a distinção na compreensão da
dialética reclusiana como Francis Pelletier destina atenção, se bobear, um dos poucos autores que tentaram, ainda que olhando Elisée Reclus pelo retrovisor elogioso.
No caso
da geografia há muitos que afirmam a dialética marxista como método
não ter trazido nada útil para algumas demandas científicas geográficas.
Inclusive na geografia física, cartografia, regionalização e por
outros caminhos que o embate ideológico fica mais ou menos exposto.
Salvo,
claro, incluir as demandas concretas dos trabalhadores. Então,
qualquer trabalho de geografia que penda para além de ser crítico,
ser dialético, tem que incluir as contradições sociais entre
classes proprietária dos bens, do processos produtivos,
comunicativos, forças de opressão e controle e do outro, a classe
trabalhadora.
Apesar do marxismo ser capaz de analisar as contradições e disputas intercapitalistas não aborda dialeticamente as contradições interproletárias que vê o proletariado como um todo ou dividida entre os que são pueris quando são alienadas e heroicos quando são conscientes da sua condição de classe.
A
síntese da luta de classes (tralhadores e patrões/capital-trabalho
- sociedade e natureza /corporações - países ricos avançados
tecnológicos industriais/países dependentes ou subservientes) e
desses pares dialéticos, grosso modo, é o que move a sociedade e
para alguns é o motor da história. E se são pares dialéticos, certamente disso se espera alguma síntese.
Em
razão disso um estudo marxista tem que ver as bases, buscar a raiz das
questões que explicam o desequilíbrio entre as classe e assim dizer
a razão de um determinado espaço geográfico se apresentar ou se
transformar ou se especializar ou se esvaziar pela perda de interesse
em suas virtudes outrora cobiçadas, exauridas ou decadentes. Como a
questão é cultural e política, tende-se dizer que um estudo com
essa base na dialética marxista é mais ideológico do que
científico.
Impera
dizer que estudos nas áreas das ciências naturais não desfrutam em
nada dessa dialética marxista. E seria justo, pois a história e a
dialética está no campo só social e não sendo a natureza auto
consciente, não é histórica, nem dialética, pois os processos naturais seguem
rotas próprias em que nada do emocionalismo humano interfere.
Um pesquisador que estuda desabamentos de encostas em áreas urbanas ou
rurais, talvez tenha que ir além da física e da mecânica dos solos
para oferecer respostas ao deslocamento de solo onde a ação humana
é mais explicativa do que a estrutura do solo. E realmente, não há
nada de histórico em estudar a organização das células de uma
Taioba. Pode se antepor um esquema da organização bioquímica dessa
planta a outro. Uma tese e uma antítese ou várias antíteses
sobre isso. Nessa comparação ou de outras antíteses se pode chegar
a uma conclusão mais próxima do funcionamento celular da Taioba ou
uma síntese. Seja como for, só se descobriu alguma coisa a mais sobre a fisiologia da Taioba, mas isso não irá torna-la um coqueiro.
Mas o
materialismo histórico dialético trata das coisas humanas em
sociedade e em conflito de interesses desiguais, contraditórios e
por isso mesmo combinados. Aborda desejos, interpretações,
contextos, sujeitos e interesses humanos. No meio do curso da
história pode ocorrer uma revolução, uma greve, uma guerra, uma
epidemia, a falta de alimentos e pressões contra a vida humana
provocadas por outros seres humanos. Uma calamidade natural pode
agravar a desigualdade já estabelecida. Quem cria a desigualdade não
é a escassez de recursos naturais, mas os seres que se apropriam
dessas virtudes.
Segundo
Francis Pelletier a dialética reclusiana difere da marxista, dizendo ela ser simples em sua explicação e de difícil aplicação que em parte
parece beber na concepção dialética de Proudhon. Por assim dizer, a dialética reclusiana
escapa da dialética clássica dos contrários que se opõem e se
excluem e da hegeliana de dois termos contrários que dão origem a
um terceiro novo termo que seria a síntese.
Afastando-se da
afirmação-tese, negação-antítese, negação da negação síntese
e de outros pilares das leis dialéticas, tal como o processo,
mudança de quantidade em qualidade, por exemplos. No sentido da
dialética reclusiana, as aparentes oposições como: autoridade e
liberdade; igualdade e liberdade; homem e mulher; guerra e paz
formam tensões contraditórias que são oposição e combinação ao
mesmo tempo que não resultam em uma síntese, evoluindo em balanço
(Proudhon) e em equilíbrio (Reclus).
Pelletier
interpreta que essa dialética reclusiana é mais próxima do
equilíbrio representado pela filosofia do Tao – Yin e Yang. Por
isso, o peso da história é menor ou de outra forma assimilado do
que é fundamental no materialismo dialético. Segundo Pelletier, Reclus não via
apenas progresso sintético da sociedade, mas após qualquer
revolução, havia regressos ou retrocessos. A história não apenas
progride, mas contém elemento da regressão. Isso cria uma oposição
clara ao que se diz da lei dialética de mudança ou que para o
processo de análise científico ou político tudo se altera, nada é
definitivo. Essa afirmação não convive facilmente com o fato de
que num determinado fenômeno não há só a mudança e a
transformação, mas um germe, um processo resiliente que persiste no
regresso, no retrocesso e na contra-revolução.
A
interpretação da história também fazia o fato se tornar uma
invenção para os anarquista, passível de ser falseada. Desse modo, alguns anarquista preferem não depositar exagerada compreensão no presente a partir de uma
heurística do tempo social, indo lá aonde a história foi
re-interpretada. Esse avanço linear e permanente da história não
condiz com os fatos. Evolui e regride e se falsifica ou mal ou tendenciosamente se
apropria do fato, que em si pode ser desvirtuado de sua verdade.
Um
aspecto que por muito tempo ficou relegado na teoria e pesquisa com
abordagem pelo materialismo histórico e dialético é o espaço que só se colocou extensamente após a II Guerra Mundial pelos marxistas, coisa que já se concebia no princípio do anarquismo ser anti-territórios de poder.
Como os
anarquistas passaram a ver a história como um invencionice dada à
múltiplas interpretações segundo seus interpretadores, o espaço era para os anarquistas o registro óbvio e fruto dessas evoluções e regressos mais
realistas do que uma hipotética gênese histórica. Assim, o termo
geohistória figurou importante no pensamento geográfico anarquista. Espaço e tempo já eram inseparáveis, mas isso não nos favorece em nada.
Hoje
porém, não se pode afirmar que a geografia qualquer que ela seja
esqueceu o espaço em detrimento da história. Em qualquer trabalho
sério e sistemático prevalecem a interpenetração de tempo e
espaço. Isso porém, na época de Reclus era uma oposição aos
conceitos de Vidal de La Blache que partia para a fabricação de seu conceito de região,
forçando a barra com a imposição do conteúdo da região natural para desembocar
num região cultural, encobrindo que tudo era definitivamente uma
regionalização política cheia de temperos metodológicos
positivistas.
Venceu
em nossos dias o conteúdo denominado geografia humana de La Blache
como um elemento natural da paisagem, contra o conceito de geografia
social de Reclus que interpõe a cultura e a política como
fundamentais. Essa naturalização da região, tanto em La Blache
como em Ratzel ao fim de tudo não desemboca no respeito ao meio
ambiente que é sempre um fonte de recurso disposta para ser
utilizada pelo homem de qualquer maneira e de forma inesgotável.
No
quadro abaixo farei um esforço para comparar a leis da dialética
marxista com as reclusianas.
Dialética marxiana
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Dialética reclusiana
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1. A Mudança Dialética.
I – O Movimento Dialético. II – Para a dialética não existe nada de definitivo… III – O Processo. |
Nada muda definitivamente, são
mudanças que carregam sua permanências.
Há processo e retrocesso não há
um permanente e inescapável e definitivo futuro descolado e
linear.
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2. A Ação Recíproca.
I – O encadeamento de processos II – O desenvolvimento Histórico ou em espiral. |
Não é mecânica, num sistema de
encadeamentos lógicos. Todo progresso que vá em sentido a
destruir a natureza, eliminará, limitará ou servirá para
poucos. Segue portanto um sistema aberto de inter-relações não
lineares e escapáveis ou não fatalistas.
|
3. A Contradição.
I As coisas se transformam na sua contraria. II – afirmação, negação e negação da negação. III – A unidade das Contrarias. |
Há contradições e combinações,
transformações e permanências. No germe de um coisa está
contido o germe da outra em equilíbrio constante. Não há
síntese pura ou tudo é síntese porosa.
|
4. Transformação
da quantidade em qualidade.
I – A argumentação política II – A argumentação cientifica |
Lei baseada na física, aplicação
muito parcial para as relações sociais no espaço e tempo.
Dentro de cada quantidade de social há qualidades de social que
agem, interagem e escapam de qualquer medida. No campo humano se
pode ebulir em um grau de temperatura ou cinquenta graus ou a
duzentos.
|
A
impressão que se dá é que a dialética marxiana é mecanicista,
determinista, fatalista e religiosa. Basta substituir a ideia de
história pela palavra Jesus que o ato de pesquisa messiânico fica
explicitado. Existe só um caminho, nesse caminho o tempo presente é
prenhe do futuro inescapável e ele chegará a um ponto em que a
sociedade será socialista e que a luta de classes findará junto com
todas as contradições humanas.
Se
formos marxistas, e se tudo muda, uma sociedade assim, após a
ditadura ou governo do proletariado, será seu oposto ou será sua
negação-antitética. Isso pode levar a dizer que não será
capitalista nem socialista?
Brutalmente
dizendo, há quem compre a força de trabalho e há quem a venda. Sendo
todos donos de sua força de trabalho, não significa que não haverá
contradições. Um sistema social desse tipo é o anarquismo, pois se
cada um detém seu poder e sua força de trabalho, não deverá
existir hierarquia, pois somos finalmente co-responsáveis por tudo e
por todos donos de nossa força de trabalho. Não haverá
desigualdade.
Não
parece tão idílica essa compreensão.
O
problema de todo o questionamento metodológico em ciências sociais
é que elas acabam desembocado através da ciências naturais e seus
métodos, no desejo ou na esperança de um tipo outro de sociedade.
Enquanto nas ciências naturais é possível descobrir como funciona
uma célula, um átomo ou a mecânica de solos, nas ciências humanas,
todos esses métodos são primeiramente ideológicos e desejam chegar
a um tipo de sociedade. Nelas há um sonho de um programa social que se estabeleça,
então que, ainda que se apurem verdades sobre o ser humano e sobre a
sociedade, sempre estará mais perto da fé e da religião do que
alguma verdade de fato.
Um
trabalhador reage à sua expropriação não por uma iluminação
religiosa chamada “consciência de classe e histórica” pode ser isso e pode
não ser isso que o move ou imobiliza. Nunca uma ação da classe
trabalhadora partiu de um ápice de consciência de classe, senão,
todas as conquistas gerariam mais consciência e mais rupturas. E o
que ocorre é que a cada conquista há tanto mais imediato de acomodação de classe
como a do indivíduo.
É dado
ao termo classe unida jamais será vencida, mitificada essa união
como única salvação dos oprimidos é ingênua, verdadeira
como mentirosa, mas profundamente religiosa. Embora se reconheça que
o ser humano só tenha chegado ao ponto que chegou pela cooperação
em sociedade esse "irmãos dai as mãos" é reducionista e profético.
Feyerabend,
em seu “Contra o método” não está sendo exatamente anarquista
por recusar os métodos normais. Ele é metodólogo, mas não
é anarquista. Só oferece a perspectiva de que se algo está sempre
chegando a um mesmo resultado e que isso é insuficiente, que se mude
o método. Intuitivo, regressivo, não contraditório, emocionalismo
ou qualquer coisa que siga outro procedimento.
Não há
nada num possível método anarquista que vá oferecer algo para as
ciências naturais, salvo a destinação e objetivo desse
conhecimento e seu uso contra ou a favor da sociedade.
Do mesmo modo, a física
quântica não é anarquista por dizer em uma de suas partes que algo
é matéria ou energia segundo quem a observa. Isso seria igual dizer
que não há história ou fatos, mas suas interpretações.
Ainda
que haja muitas versões de nosso aparente presente e suas mil
bifurcações, ainda assim, a perspectiva é humana e por isso uma
variação de mesmices e do inesperado. Então, fazer ciência social a partir da
física quântica é outra religião relativista. Tanto menos, não será um
caleidoscópio metodológico um hipotético método anarquista.
Os
pós-anarquistas são muito criticados por terem lido mal os
anarquistas clássicos. No entanto, vieram com uma inquietação
justa, há um método anarquista? Como o anarquismo responde ao
estruturalismo, pós-estruturalismo, fenomenologia e à condição de
pós-modernidade ou alta modernidade, seja lá o que é essa
sociedade de fragmentos.
Em que
um estudo anarquista tem a perder em adotar a abordagem histórica
radical e dialética? Tempo de trabalho eu respondo. Perder o lastro
de legitimação ancestral e mitificação do messias ou do iluminado
“conteúdo histórico”. O espaço desigual é por si desigual e a
sociedade desigual, formada historicamente ou não é a matriz
constituída pelos que possuem e outros não. A reafirmação histórica
da desigualdade não a torna mais transparente e por isso mais
mutável.
O
refinamento histórico, para alguns religiosos, também seu ganha
pão, não é garantia nenhuma de aprender com erros para não
repeti-los. Na prática isso apenas garantem rebuscado e profundos
trabalhos históricos e só isso. Mudamos só o modo dos aristocratas
e monarquistas de se auto afirmarem na hereditariedade do poder por suas
riquezas, para no lugar colocar o trabalhador. Mas isso,
efetivamente, não interessa a nenhum trabalhador.
O que
muda mesmo é o desejo humano de corromper essa ordem de injustiça,
em seu tempo, espaço e desejo, talvez, nem chegue a ser isso a tal
de “tomada de consciência”. O imediato em si da injustiça e da
falta é que faz a sociedade agir. E agir do seu modo e não do modo que se acha que eles devem agir.
Não
existindo propriamente a necessidade de criar um método anarquista
para as ciências sociais e naturais, pois a questão é menos de
procedimento e de medidas, mas da finalidade da pesquisa, então, o que há a
fazer com o anarquismo e ciência?
O
anarquismo é por origem anti-hierarquia, anti-estatal/nacional,
mutualista e qualquer esforço em pesquisa e político é para
alcançar o mais amplo e qualitativo grau de felicidade humana.
Por isso, um estudo pode seguir qualquer desse métodos científicos
messiânicos. No entanto, perder essa ênfase de profecias das terras dos "benvirás!"
O
anarquismo vai relativizar a luta de classes como um ser único e por
isso com anseios únicos, vai deplorar qualquer estabelecimento ou
fortalecimento do controle e buscará avaliar sempre em que grau
esses estudos avançam na compreensão inescapável que somos seres
sociais e por isso, que inerente à nossa consolidação cultural é o
mutualismo como ética primordial entre os seres e as sociedades. Lembrando que, embora se use os métodos anarquistas em corporações, o
anarquismo é anti-capitalista. Mas a empresa capitalista não se torna anarquista por utilizar o conceito de cêlulas de produção autônomas. O método em si não faz a coisa ser boazinha e comprometida com a sociedade.
Um método anarquista, ao se consolidar, pode não resultar nos anseios anarquistas. Tal como qualquer bobagem metodológica, pode, ao final, ter contribuição para o anarquismo. Há trabalhos positivistas tão sérios que são menos colaboracionistas do que trabalhos marxistas heróicos. Isso é irônico e e algo que eu jamais pensei ser possível.
Não há
uma sociedade final objetiva, mas há uma imediata que tem que
respeitar a vida humana e o meio ambiente e por isso mesmo, nenhuma
cultura ou ambiente deve ser intocado em seus parâmetros que sejam
contra a vida e contra o direito pessoal de ser.
Não há
um acúmulo de consciência que em sua quantidade, em um determinado
carregamento de baterias de consciência de "classe" se fará historicamente uma
revolução qualitativa. Há regressos e o que talvez seja melhor a fazer é
reduzir o peso e a força do retrocesso ou pior, recuo ao mais anterior regresso, isso
é mais necessário do que o avançar aos fragalhos da volúpia
revolucionária que sucumba ao seu inseparável processo contra-revolucionário.
Ao fim, nunca teremos uma sociedade boazinha sem contradições e intacta, no que tange ao humano, nossa realidade é reduzir danos e ampliar benefícios. Isso talvez nos ajude a não depositar tanta religiosidade no método e nas explicações teóricas da sociedade.
Não existe qualquer determinante que diga que uma sociedade deverá ser de tal modo!
Espero não ter contribuído em nada!