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Uma das maiores dificuldades de
voltar para o ensino superior era como encarar a formação obrigatória.
A diferença do ensino fundamental
é que se um pai ou mãe não coloca o filho na escola pode ser processados por
abandono intelectual, mas um estudante universitário não é obrigado a cursar
uma graduação. Ele precisa querer e tem que agir para isso!
Notei que uma das coisas mais
difíceis de inspirar em um graduando é a pro-atividade no próprio conhecimento,
pois muitos deles acreditam de fato que quem vai fazer avançar é um bom
professor, com ótima didática e pedagogia incólume.
Na pedagogia anarquista o
auto-aprendizado e autonomia do sujeito para busca do conhecimento é a chave
para formar uma pessoa menos arredia ao saber e que aja diretamente empenhado
consigo e respeitando o mesmo processo nos seus ambientes coletivos.
Reconheço que a maioria é fruto
de uma educação constrangedora aonde o professor melhor era sempre o que
forçava, exigia, pressionava, metia medo se opondo ao bom ou boa professora cândida,
doce, afável e agradável, assim, o critério era a afetuosidade ou o grau de
tirania que cada um se localizava. Num caso e no outro é a educação obrigatória
que faz o professor se colocar num papel ou outro por sua insegurança de
bonzinho ou carrasco.
A maior dificuldade do ensino
superior é verificar estudantes e assessorar para que eles comecem a buscar
livros, fóruns, grupos e situações que ampliem sua necessidade intelectual ou a
que lhe caiba. É ele ou ela pegar um livro ou uma linha de pensamento e seguir.
O professor universitário, mesmo
não desejando ser, representa um nível de violência simbólica, pois detém um
conhecimento, uma bagagem de leitura e de discussão que o favorece diante de
uma classe que tanto tem dificuldade de entender aspectos da teoria, como não
acredita que o que está lendo está alterando a sua maneira de ver os fenômenos.
Óbvio que o conhecimento muda a
maneira de ver amigos, familiares, políticos e a sociedade e ocorre uma resistência
monumental em permanecer a mesma pessoa, não modificar e embora queiram um
diploma para alguma finalidade, negam que a formação proativa mudará toda a sua
forma de verem as coisas, isso, ainda que ao longo da vida não irá parar. A
vontade de ser o mesmo joga um papel de resiliência negativa. Desejam mudar
salário, dignidade, respeito, modo de olhar a vida, porém, seguem um padrão conservador, das crenças,
das ideologias, dos saberes acumulados em seus meios e da própria relação com o
conhecimento.
Assim, o modelo de um professor
qualificado na graduação é um que lê muito, coloca muitos textos à disposição e
em geral os faça sentir anulados intelectualmente e reféns desse professor
seguinte as suas exigências. Muitos professores de graduação se sentem bem
nesse papel de exigir artigos, leituras, fichamentos e provas. Talvez tão
apegados às suas disciplinas que a única coisa que um estudante de graduação
tem que fazer é ler, digerir e ter um imenso mal estar de ainda assim se
sentir burro.
Juntando resistência a mudar e a
dos docentes esmerados em suas epistemologias, não há tempo para entender e estimular
estudantes a quebrarem suas resistências e auto sabotagens contra o processo de
auto didatismo. E parece que a maioria do professores uníssonos reclamam que
fora seus grupos de pesquisas as classes são arrastadas por chicotes
pedagógicos nas cobranças de leituras, debates e escrita.
Tentei mudar isso. Abri mão de
seguir um receituário de textos. Deixei dois textos básicos à disposição. E
pedi simplesmente que dentro do que eles compreendiam que a disciplina oferecia
e como futuros que fizessem um projeto que tivesse coerência, prazer,
curiosidade pessoal no tema. FAÇAM O QUE QUISEREM!
Apenas lhes garanti que
ocorreriam duas provas escritas para eu diagnosticar como eles se expressavam
em escrita formal e que seria muito exigente nessa análise, mas só daria nota a
elas e as consideraria se pedissem individualmente, pois a mim interessava o
trabalho.
No absurdo da explicação eu
disse: Se decidissem fazer uma feijoada ou uma festa poderiam fazer, desde que
explicassem e dialogassem a relação com a disciplina. Foram mais de 16 créditos
explicando a liberdade pedagógica. Havia horas que percebi até dor em alguns
estudantes. Ocorreram reclamações no departamento pelo linguajar e outras
questões didáticas, mas o pavor consistia na liberdade obrigatória.
Para não obrigá-los a serem
livres disse que se exigissem provas que lessem os textos e me exigissem a
prova quando se sentissem necessitados desse modelo arcaico. Nesse período de experiência
notei que pedir para fazer algo que desse prazer ou gostassem era quase
ofensivo.
Sugeri a quem não quisesse
aceitar a proposta que poderiam ir embora que eu daria a nota mínima. Sugeri
que se quisessem só aparecer para apresentar o trabalho que eu não reprovaria
por falta. A descrença, medo, desconfiança foi confirmada com a palavra
APRESENTAÇÃO!
As aulas virariam encontros de
orientação e nada sobre a disciplina como um todo. A partir dessa escolha e da
orientação eles iriam escolher a forma de concluir esse trabalho. Eu intuía que
muitos iam achar a lógica do seminário a melhor forma. Mesmo dizendo que
poderia ser artigo, dinâmicas, atividades externas, teatro, festa e qualquer
coisa que se sentissem bem.
Quando percebi que se avizinhava
o fim do período eu fui obrigado a fazer um sorteio para que eles começassem a
apresentar os trabalhos. Eis que o sentido de apresentar era aquele de fazer
seminários. Tive que intervir e dizer que seminários era muito passivo e eu queria
que as pessoas se mexessem e que isso não teria nenhum papel no exercício de
docência futura estar parado na frente utilizando um Power Point sequencial.
Quando perceberam que a lógica do
seminário não iria ter efeitos e que precisavam se envolver com o tema, começou
outra fase de desconforto. Uma parte compreendeu desde o início a comunicar de
diversas formas. A maioria foi só compreendendo na medida que avaliava as
apresentações e práticas sugeridas.
Houve exposições guiadas sobre a
condição dos idosos, história da pornografia, reprodução de chãos de fábrica e
fabricação, dinâmicas com os estudantes, apresentação de miniaturas, apresentação
de práticas de ensino reproduzindo exemplos das nossas aulas, pesquisas de
campo, vídeos entrevistas e a práticas diversas.
Ocorre que a UEPB entrou em greve
e tive que interromper esse processo e não sei o que será mostrado quando
reiniciar as aulas. Tenho, pelo visto a impressão que consegui alcançar o
objetivo, mas não posso dimensionar os efeitos. A fama de irresponsável correu
corredores.
As disciplinas que orientei foi
de geografia econômica e da população. Esta foi a primeira vez que tentei
experimentar numa instituição formal alguns preceitos da pedagogia anarquista,
sabendo que todo ensino autoritário apreendido ao longo da vida dessas pessoas
ia ficar batendo e sendo confrontado, que a interpretação dessa prática ia ser
mal vista.
No entanto, do período anterior
para esse não terminado eu penso que tenha mudando ou favorecido outra forma de eles entenderem o compromisso do
aprendizado não pode partir de cobranças externas, mas da própria pro -
atividade em sentido ao conhecimento.
As conclusões parciais é que
mesmo sabendo do constrangimento e náusea e/ou desconfiança dos graduandos em
relação aos docentes, que agir pela autonomia do sujeito pode doer em docentes
zelosos e abscedidos/obcecados a ensinar. Viciados em ensinar, predestinados a ensinar,
iluminados a ao ensinar e ultra auto exigidos ensinar, o que os faz sofrer
violentamente ao abrir mão de suas vastas bibliografias extenuamente estudadas.
Tentar não ensinar é o que mais
pode doer ou contrariar docentes que se sentem sagrados em suas disciplinas.
Quanto a mim, despojei-me disso, pois o ato de estudar pelas próprias decisões
é o único legado verdadeiro que uma pessoa com pós-graduação não pode fingir
que desconhece.
PS: A resistência a mudar é grande e deve ser um esforço coletivo. Ao se forçar a liberdade os estudantes ainda inseguros tende a fazer o formal e rotineiro. Num ambiente aparentemente livre as regras invisíveis já estão estabelecidas. Professor fala, estudante assiste, professor reclama, estudante reclama e opressão oprimido ocorre como normal. Ao fim que se enfiei uma nota e siga o curso. A falta de autonomia dos sujeito cria um ambiente de trapaças e de falsas satisfações. O trabalho docente em geral é mediado por uma nota que pouco diz e é muito desejada, mais que o desenvolvimento pessoal. Perder essa ordem tanto da parte do professor como do estudante é quase criminosa...alguém tem que mandar....