Tal como a saúde privada não viveria sem os leitos do SUS, as escolas privadas não vivem sem estudantes de bons de escolas públicas e assim, conseguiram vender uma imagem falsa de que escola pública era uma maravilha no passado.
Para quem cara pálida? Essa é a pergunta que desmonta esse sofisma.
Há muitos anos escrevi um texto "Colheita Maldita" sobre a coleta que as escolas privadas fazem dos melhores estudantes de uma cidade, como quem compra bons jogadores de futebol de países pobres para montarem suas seleções.
A escola privada, tal e qual a saúde privada desfrutam de um status que não é pleno e verdadeiro. Essa herança neo-liberal, mas que tem genese anterior, contrário de ajudar países pobres, cria muitas distorções bem aceitas por pais neuróticos com o destino dos filhos.
Mas os dados no texto abaixo, concretizam o que os professores já sabem. A mídia criou um medo tão grande da escola pública, mentiu tanto sobre a escola para poucos e boa do passado, que herdamos um porcaria de educação dicotômica no Brasil...escola privada boa para ricos e ruim públicas para pobres!
Finalmente, o que é escola boa para o mundo capitalista estou me fodendo para isso. Mas as pistas estão bem indicadas no texto que segue. Uma delas é que a classe média que alimenta esse mercado educativo privado estão sendo enganados. Acredite se quiserem!
Por que fazer o Ensino Médio em uma escola particular? Se a resposta
for obter aprendizagem suficiente para passar em vestibulares, grande
parte das famílias pagantes desperdiçou o alto investimento financeiro.
A conclusão é de um estudo das notas médias das instituições no Exame
Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2012, feito pelo pesquisador Ocimar
Alavarse, da Faculdade de Educação da USP. A análise revela que metade
dos alunos da rede privada têm desempenho equivalente àqueles que vêm da
rede estadual de ensino.
Segundo o levantamento, 98% dos alunos da rede pública de todo o Brasil
alcançaram até 560 pontos – a média foi de 479,4. Já entre as
instituições particulares, 52% dos alunos atingiram até 560 pontos, e a
média foi um pouco maior, de 558,1 pontos. “Famílias que fazem
sacrifícios e pagam mensalidades com o propósito de ver os filhos na
faculdade estão sendo enganadas, ao menos nesse ponto”, afirma o autor
da pesquisa. A constatação fica mais alarmante quando comparada ao
movimento de saída da classe média do ensino público para o privado. Nos
últimos cinco anos, com a melhora geral no nível de renda das classes
mais baixas, o total de matrículas na Educação Básica da rede pública
caiu 3,8 milhões, enquanto cresceu 1,3 milhão na particular. “Muitos vão
em busca de base para o Ensino Superior, mas é uma ingenuidade”,
conclui Alavarse.
O próprio recorte feito para chegar às notas médias é um claro
indicativo de como o propósito dos estudantes de instituições privadas é
a faculdade. Foram contabilizadas as escolas brasileiras que tinham
mais de 50 alunos no último ano do Ensino Médio e, entre esses, mais da
metade tenha prestado o exame. Instituições federais e municipais foram
desconsideradas pela participação reduzida. Das 18,5 mil escolas
estaduais do Brasil, sobraram apenas 5,9 mil que preenchiam as
características buscadas, ou seja, em mais de dois terços a maioria dos
alunos sequer faz o Enem. Já entre as 7,8 mil particulares do País, 5
mil tinham o perfil, mostrando que o Ensino Superior – a que o exame é
principal canal de acesso – constitui alvo de seus alunos.
Não se trata de igualdade entre as médias das unidades nos dois
sistemas. As tabelas construídas pelo pesquisador mostram que há
diferenças entre escolas públicas e particulares. Os pontos a mais das
instituições pagas, no entanto, não são suficientes para levar seus
estudantes à aprovação direta, por exemplo, pelo Sistema de Seleção
Unificada (Sisu), que distribui vagas nas universidades federais por
meio das notas do Enem. Equivale a dizer que, embora com notas
diferentes, 98% das estaduais e 52% das privadas ficariam com vermelho
na avaliação e seriam reprovadas.
“O caso das públicas é dramático, mas não é novidade”, afirma Alavarse.
Na curva de distribuição das médias das escolas, o que chama mais a
atenção é que 16% teriam 449 pontos, se a média de seus alunos fosse a
nota da escola. Com isso, não conseguiriam sequer uma certificação de
conclusão do Ensino Médio, documento dado a quem não cursou a etapa de
ensino, mas faz a prova e obtém acima de 450 pontos. “Se o exame fosse
aplicado à escola, esse porcentual não teria direito a diploma”,
lamenta.
As escolas estaduais que ultrapassam essa pontuação não vão longe. Se
for considerado o estágio de 460 pontos, o total acumulado de escolas
vai a 27,9%. “Com uma margem de erro mínima, cerca de um quarto oferece
ensino abaixo do que o País estabelece como exigência para se considerar
que a pessoa tem o Ensino Médio”, afirma Alavarse. Raras particulares
têm essa média. As instituições privadas com notas de até 460 pontos são
apenas 0,8% do total.
Chance no vestibular
O patamar em que as duas redes se veem juntas é o que seria exigido nos
processos seletivos para curso superior. No Sisu, os cursos mais
concorridos exigem acima de 700 pontos no Enem. O pesquisador usou como
pontuação mínima para ter chances em carreiras menos disputadas o
recorte de 560 pontos. É esse o recorte que deixa de fora 98% das
públicas e 52% das particulares pesquisadas. “Estamos falando de uma
média para tentar vagas menos concorridas. Se formos falar em carreiras e
universidades muito seletivas, apenas aqueles colégios top,
inacessíveis para a classe média, dão chance”, avalia.
O estudo de Alavarse foi elaborado para uma apresentação no Conselho
Municipal de Educação de São Paulo e ainda não está disponível para
consulta na internet. Diante das conclusões, ele e outros colegas do
Grupo de Estudos e Pesquisas em Avaliações Educacionais, do qual é
coordenador na USP, estão debruçados sobre os dados por alunos, para
refinar a média por escola. “Isso aprofunda a análise, mas posso
adiantar que os resultados seguem na mesma direção.”
Rodrigo Travitzki, integrante do grupo, desenvolveu tese de doutorado
sobre os limites do Enem como indicador de qualidade escolar. Uma das
constatações é de que pelo menos 75% da média da escola explica-se pela
renda familiar e escolaridade dos pais. De acordo com ele, sem levar em
consideração o contexto socioeconômico, há uma diferença relativamente
grande entre as médias das notas de instituições estaduais e privadas no
exame, de 91 pontos. Porém, quando se retira a influência do fator
socioeconômico, apenas 26 pontos as separam. “Isso significa que a
diferença entre os dois tipos de escola é pelo menos três vezes menor do
que se imagina”, afirma.
Para Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à
Educação, a consciência de que boa parte da rede particular não garante
ensino de qualidade poderia fazer com que mais pais participassem da
busca por melhor educação. “O nosso problema é estrutural, muitos
professores são os mesmos nos dois sistemas. Mostrar as carências só na
escola pública reduz o debate e fortalece a privatização”, afirma.
O professor Alavarse reconhece, no entanto, que o vestibular não é o
único motivo pelo qual famílias escolhem comprar um serviço que está
disponível a todos por financiamento público. “Muitos o fazem pelas
relações que seus filhos vão ter para a vida ou em busca de segurança e,
provavelmente, eles têm alguma razão”, diz.
Uma pesquisa do Ibope Inteligência realizada com pais que tinham filhos
em instituições particulares em São Paulo, Distrito Federal, Aracaju,
Salvador, Curitiba e Porto Alegre, em 2010, apontou quais são as
principais preocupações das famílias com crianças e adolescentes em
instituições particulares. Quando perguntados sobre o que levavam em
conta, o item mais lembrado, por 84% dos entrevistados, foi “segurança”.
“Qualidade de ensino” veio depois, com 81%. Na sequência do que mais
importa apareceram “disciplina”, com 74%, e “amizades”, citadas por 56%
dos pesquisados.
A advogada Tatiana Panno Lombardi, moradora de Cajamar, na Grande São
Paulo, tem um filho de 15 anos matriculado no Ensino Médio em escola
particular do município. O resultado do estudo não a surpreendeu. “Sei
que não vai dar para entrar em uma boa universidade só com o Ensino
Médio que ele faz, e a gente já imagina que vai pagar cursinho. Mesmo
assim, jamais colocaria meus filhos em escola pública”, afirma.
Ela admite que não conhece as instituições da cidade, mas julga que
“são péssimas” pelo o que acompanha na mídia. “É um preconceito, sim,
mas, pelo que observamos em termos de notas baixas, greve, falta de
professores, violência e drogas, eu não arriscaria.” Atualmente, Tatiana
gasta cerca de 750 reais por mês entre mensalidade e lanche com o filho
adolescente. A caçula, de 2 anos, também estuda em instituição
particular. “Parte importante do nosso orçamento vai para Educação.”
Pais que investem na educação dos filhos fazem falta no ensino público –
não só porque poderiam contribuir financeiramente com as escolas. Um
estudo do cientista político norte-americano Robert Dahl, morto este
ano, mostrou que a saída de famílias mais educadas da rede pública piora
as perspectivas das crianças que ficam. A partir de um exemplo de New
Haven, em Connecticut, ele explica que essas pessoas teriam mais
condições de exigir padrões de qualidade, mas se preocupam menos com a
educação pública e mais com as unidades que frequentam. Pior: podem se
opor a maiores investimentos em Educação já que são taxadas duplamente
pelo serviço.
Alavarse é contrário a campanhas contra a saída da classe média da
escola pública: “Não tem de ser boa porque é frequentada por um dado
segmento, tem de ser boa e pronto”. Ainda assim, diz, poderia haver
equilíbrio entre os resultados, se o contexto socioeconômico fosse
equivalente. “A particular se sai melhor porque recebe alunos
melhores.”
Para Travitzki, um dos pontos importantes do estudo é mostrar essa
proximidade. “Apesar das dificuldades conhecidas na escola pública, bons
trabalhos são feitos. Se não reconhecermos isso, podemos entrar num
caminho perigoso, promovendo o sucateamento da rede e estimulando a
privatização gradual da educação, travestida de busca por qualidade”,
afirma. Ilusão que, em 52% dos casos, não resiste ao Enem.